sábado, 14 de junho de 2008

CIDADANIA

O termo cidadania nos parece muito comum, de modo que ao pronunciarmos , ou mesmo nos depararmos com alguma situação na qual se menciona, logo pensamos que é algo muito bom. Em geral percebemos que várias pessoas utilizam-se da palavra cidadania para se referir ao bem estar, a direitos e deveres. É verdade que esse conceito se refere às pessoas, cujas vidas se mostram interdependentes, isto é, trata-se de algo que tem a ver com a vida em coletividade. Em outros termos, a cidadania pode ser considerada como algo que permite uma convivência com as demais pessoas, de modo que o que uma faz, ou pode fazer, não prejudique ao outro, além de satisfazer o sujeito da ação. Bom, mas, para compreender essa historia de cidadania, é preciso saber como tudo começou e quais os contextos e experiências que permitiram o uso do termo cidadania.Na Grécia e na Roma Antiga a palavra cidadania se referia aos direitos e deveres do cidadão, isto é, daquele que vive na cidade, mas que possui status de cidadão. Acontece que nem todos eram considerados cidadãos, mas sim, as pessoas que detinham poder econômico e, conseqüentemente, representavam a elite. Estavam fora os escravos, as mulheres, crianças e outros. Ao longo do tempo essa idéia de cidadania praticamente sofreu pequenas alterações, todavia, a sociedade continua desigual e injusta como sempre. A prova disto é que quem tem bastante dinheiro é quem detém poder sobre a maioria. Caso você não saiba, veja quais as principais empresas nacionais e multinacionais, os banqueiros, os latifundiários, entre outros, os quais comandam a sociedade e impõem regras e limites para a grande parcela da população. Vale lembrar, também, que parcela significativa de políticos que estão no executivo e no legislativo, em geral ocupam determinados cargos muito mais para manter seus privilégios do que por necessidades financeiras, evidentemente.Na opinião de DALLARI, D.A, em sua obra: Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna, 1998. p.14, a cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social.Você, por acaso, vê a cidadania acontecendo dessa forma, isto é, você vê a cidadania de fato para todos, no caso do Brasil e da América Latina, por exemplo?É claro que não. Na Idade Média a cidadania se restringia aos senhores feudais, aos reis e ao clero. Ou seja, a cidadania era somente para a nobreza e para o clero, de modo que ficavam de fora as mulheres, os servos, os camponeses.Na idade Moderna a situação não mudou muito, pois, a cidadania continua sendo privilegio da nobreza, traduzida agora na burguesia que ascendeu ao poder. Ficaram fora da idéia de cidadania os trabalhadores de forma geral e ainda as mulheres e crianças. No no final da Idade Moderna, observa-se um sério questionamento das distorções e privilégios que a nobreza e clero insistiam em manter sobre o povo. É aí que começam a despontar figuras que marcariam a História da cidadania, como Rousseau, Montesquieu, Diderot, Voltaire e outros. Esses pensadores passam a defender um governo democrático, com ampla participação popular e fim de privilégios de classe e ideais de liberdade e igualdade como direitos fundamentais do homem e tripartição de poder. A idéia de igualdade, liberdade e fraternidade, lema da Revolução Francesa, apesar de soar muito bonita, continua ainda no plano das idéias, tendo em vista que a maioria da sociedade, isto é, os trabalhadores do campo e da cidade, as mulheres e as crianças, são, ainda, alvos de grande exploração e de preconceito, muito embora tenhamos o direito do voto para as mulheres e sua participação na vida política, até mesmo ocupando importantes cargos. No Brasil, a cidadania ainda é privilegio da pequena parcela abastada da sociedade, de modo que é comum o grande numero de favelas, moradores de rua, meninos de rua, trabalho escravo, prostituição infantil, exploração sexual, dentre outros problemas os quais denunciam a cidadania como objeto/ privilégio de poucos. Além desses problemas citados, por quê não falar da discriminação contra os negros e índios, cujas marcas da exploração são profundas até os nossos dias. Para uma parcela significativa da sociedade o índio é algo estranho, antiquado, preguiçoso e inútil. É comum ouvirmos diversas criticas e falas totalmente desrespeitosas em relação aos povos indígenas. É como se eles fossem o problema central, uma vez que não se adequam a sociedade mercantilizada, racional e industrial capitalista, cujos valores supremos se resumem ao dinheiro, ao lucro fácil e ao consumo. Em função dos graves problemas sociais: pobreza, exclusão, violência, prostituição, insegurança, fome, miséria, falta de moradia, péssimas condições de saúde e de educação, entre outros, cuja maioria da sociedade convive diariamente, é que surgiram os movimentos sociais voltados para as classes populares. Nesse sentido, temos os sem-teto, os sem-terra, movimentos em defesa dos direitos humanos, movimentos feministas, organizações não-governamentais que atuam com: menores de rua, favelados, mulheres trabalhadoras rurais, entre outros que se espalharam pelo país afora. A existência de movimentos sociais específicos e de organizações não-governamentais em defesa dos menos favorecidos denuncia a necessidade de cidadania para todos. Nesse sentido, nos últimos anos surgiu a idéia de cidadania coletiva. Ou seja, trata-se de uma cidadania voltada para as coletividades e não apenas objeto individual, isto é, privilegio individual para quem tem dinheiro e pode consumir ao sabor do mercado. Para se ter cidadania de fato para todos é necessária educação critica, isto é, educação de qualidade, onde os estudantes não sejam meros receptáculos de informações e de conteúdos inóspitos, direcionados apenas para garantir a reprodução do capital. A cidadania não se restringe também ao emprego, mas urge a mudança nas relações de trabalho, de modo que o trabalhador não seja visto como mera extensão de uma máquina – como se não fosse dotado de sentimento, pensamento e capacidade de ação. É fundamental se criar uma nova mentalidade, sendo esta voltada para a humanização, para a intelectualidade e espiritualidade. A espiritualidade a que me refiro não se trata de adoção de nenhum credo religioso ou instituição caritativa ou ainda fanática, mas sim, uma espiritualidade a partir das idéias que conduzem ao crescimento individual e coletivo, o que se dá por meio de estudos, leituras, debates e reflexões. Nessa ótica a que me referi, ou seja: a humanização, a intelectualidade e a espiritualidade, a educação não se resume ao que temos, isto é, voltada para a ótica da produção e para o consumo. É fato que necessitamos, para viver, de alimento, roupas, lazer e prazer, mas isso não deve se traduzir em escravização para o consumo. Assim, a cidadania só existirá de fato quando formos capazes de construirmos uma sociedade humanizada, fora da esfera da produção capitalista ou de qualquer outro modelo que escravize. Ainda estamos muito longe disso não é?
Texto publicado no blog OLHAR CRÍTICO

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